A
cidade de Acopiara foi palco, no dia 05 de abril, de audiência pública para
debater os problemas da seca e seus efeitos na vida das famílias,
principalmente em comunidades rurais, onde já é visível a falta de alimentos
para o rebanho, água potável e comida.
O
evento que teve como tema “Água, Crédito e Semente – o drama da estiagem” foi uma
iniciativa da Diocese de Iguatu, através da Comissão de Justiça e o Fórum
Acopiara em Defesa da Vida. O Centro Social Paroquial, local do encontro ficou
completamente lotado por agricultores, pequenos criadores, sindicalistas e
representantes de movimentos sociais interessados em participar dos debates.
Estavam
presentes, os deputados estaduais, Mirian Sobreira e Leonardo Pinheiro, este
último presidente da Comissão de Agricultura, da AL, representantes da Cogerh,
Conab, Cagece, Ematerce, Câmara Municipal, os promotores públicos, Naelton
Barros (Acopiara), Francisco das Chagas e Leidomar Nunes Pereira (Iguatu), os
prefeitos, Vilmar Félix Martins (Acopiara), Expedito José do Nascimento (Piquet
Carneiro), Fátima Gomes (Quixelô) e Gilvan Oliveira (Cariús). Vereadores de
Acopiara e Iguatu também estavam presentes.
Na
abertura da audiência pública foi exibido um vídeo de 20 minutos sobre a
situação vivida pelas famílias em comunidades rurais de vários municípios da
região. No documentário que foi produzido pelo Centro dos Direitos Humanos de
Senador Pompeu, depoimentos e relatos de agricultores, pequenos produtores,
lideranças religiosas, sindicais e de movimentos sociais, sobre os problemas da
seca, e as dificuldades como a falta de água para as famílias e os rebanhos, a
burocracia na chegada de socorro aos atingidos e os descasos dos governos para
um problema que já se arrasta há anos, apenas se repetindo como fenômeno
climático a cada dois ou três anos.
O
padre João Batista, vigário da paróquia de Acopiara e um dos coordenadores do
evento, fez um pronunciamento na abertura dos trabalhos. Ele criticou o atraso
na liberação de recursos anunciados pelos governos e pelos bancos públicos,
para investimentos principalmente em setores produtivos, pequenos
financiamentos para produtores e obras hídricas, que segundo Batista não
chegaram a 43% de tudo que foi anunciado. Na visão do religioso isso significa
um descaso com quem precisa desses investimentos, os agricultores. João Batista
ressaltou que aquela audiência pública estava sendo realizada para que o povo
fosse ouvido. Ele lembrou que a ideia principal foi elaborar um documento com
as necessidades mais pontuais da região, em relação à falta d’água, alimento
para o rebanho e benefícios sociais, para que seja enviado aos governos,
objetivando buscar ajuda para os atingidos pela seca.
Padre
João Batista foi enfático ao afirmar que a burocracia e a corrupção são os
principais entraves na concessão de benefícios dos governos para os atingidos
pela estiagem. Ele afirmou que dos 58 projetos anunciados pelo BNB para o
semiárido, poucos foram liberados e apenas um foi executado. O reverendo tachou
de ‘amadorismo’ a forma como a seca é tratada pelos governos e autoridades. “A
seca não é nenhuma novidade, isso é conversa para boi dormir, ou melhor, para
boi morrer”, ironizou. O padre chamou a atenção para os discursos vazios
daqueles que têm o poder de resolver os problemas e fez uma convocação: “o
poder público é inoperante, mas quem está aqui que representa o poder público,
que recebeu o voto para governar, tem a obrigação de buscar solução para os
problemas”, disse.
O
prefeito do município de Piquet Carneiro e vice-presidente da APRECE (Associação
dos Prefeitos do Ceará), Expedito José do Nascimento, quando usou a palavra se
comprometeu em levar o documento em mãos para entregar às autoridades do
Governo do Estado. Ele voltou a defender que, as ações dos governos para
atender as famílias atingidas pela seca sejam descentralizadas. “Se nós
tivermos condição de trazer essas ações para que a gente possa executar nos
municípios, vai ser mais fácil e é isso que estou lutando para conseguir
através da Aprece”.
Durante
a audiência pública, alguns temas como a burocracia na venda do milho
subsidiado pela Conab para os pequenos criadores, as dificuldades na liberação
de financiamentos através do Banco do Nordeste e a falta d’água foram os mais
relatados. No momento em que os agricultores, pequenos produtores e
representantes de movimentos sociais puderam se manifestar fizeram
pronunciamentos ‘acalorados’ e desabafos que provocaram o manifesto de mais de
350 pessoas que estavam presentes. Foram duras críticas aos políticos e aos
governos, que na visão dos agricultores e lideranças sociais têm sido
negligentes com a situação.
Colapso no
abastecimento d’água
O
município de Acopiara está à beira de um colapso no abastecimento d’água. A
barragem Dr. Tibúrcio Soares, com capacidade de pouco mais de 7 milhões de
metros cúbicos de água está com menos de 7% de sua capacidade, praticamente já
atingindo o chamado ‘leito morto’, comprometendo totalmente o abastecimento de
cerca de 30 mil moradores. O gerente da Cagece, Marcelo Gutierrez, disse que o
reservatório não conseguirá atender a população por mais do que 60 dias. Outra
saída seria o açude Raimundo Morais, na localidade de Cambitos, a cerca de 4 km
da cidade, mas segundo ele, isto não seria suficiente e não daria para atender
a cidade toda em sua demanda de usuários. Ainda assim, para a água chegar até a
estação de tratamento da Cagece seria necessário ativar uma adutora que foi
construída pelo Governo do Estado em 2005 quando o município viveu situação
semelhante.
O
prefeito de Acopiara, Vilmar Félix Martins disse que a situação da seca é
preocupante, sobretudo o abastecimento d’água do município. Contudo ele
garantiu que as obras da adutora do Trussu ficarão prontas em no máximo 90 dias
para transpor água do açude Trussu, em Iguatu, para atender a população da
sede. O prefeito disse que recebeu uma ligação do próprio governador Cid Gomes
solicitando um diagnóstico do quadro de seca no município e que este documento
já teria sido enviado. Vilmar assegurou que se não houve tempo para concluir a
obra da adutora com o sistema tradicional de canos subterrâneos será usado então,
um sistema alternativo com a colocação dos canos na superfície do solo.
Ministério Público
Um
dos pronunciamentos mais fortes foi do promotor público, Leidomar Nunes
Pereira. Ele fez questionamentos ao BNB, à Conab, criticou as políticas
públicas dos governos e fez cobranças aos prefeitos por programa de benefícios sociais
locais. Ele disse que a seca no Nordeste é um fenômeno que acontece há anos e o
governo federal nunca deu a devida atenção ao problema. “Sempre nos olharam
como sub-raça, como alguém do Sul que nos olha hoje, como uma população que
come calango”. Segundo o promotor não tem sido dado ao povo nordestino à
dignidade e o respeito que ele merece.
Leidomar
disse que as audiências públicas lhe causam angústia, porque sempre há muito
discurso e quase nada de ações práticas para os problemas levantados. O
promotor ressaltou que é preciso exigir um projeto de governo para o semiárido
nordestino, ao invés dos velhos paliativos. “Nós não precisamos de esmolas, nós
precisamos é de respeito e de solução, porque se o governo brasileiro não se
convencer que nós precisamos é de um projeto de estado para o Nordeste, os
problemas da seca não vão ser resolvidos nunca”.
O
promotor indagou aos representantes do Banco do Nordeste,existem dificuldades
tanto para os grandes industriais e comerciantes que vão ao banco em busca de
empréstimo, assim como, os pequenos criadores que vão implorar pelo
microcrédito. Ele também indagou a outro órgão do governo: “Eu queria saber da
Conab, se efetivamente a ordem de entrega do milho pela sequencia das senhas é
observada”. O promotor disse que recebeu denúncia que grandes pecuaristas
retiram grandes quantidades de milho na Conab todo mês, enquanto os pequenos
criadores não retiram nada. “Eu gostaria de saber se os donos do agronegócio,
como a empresa Monta que está instalada na chapada do Apodi, derramando
toneladas de agrotóxicos no meio ambiente, se eles têm dificuldades de acesso
ao microcrédito”.
O
promotor pediu ainda que, se alguém tem conhecimento que algum agricultor está
retirando milho na Conab ao preço subsidiado e repassando para comerciantes,
que essas pessoas sejam denunciadas, não à Conab, mas sim, ao Ministério
Público. “Se isso estiver ocorrendo, denuncie ao promotor de sua cidade, porque
eu garanto que haverá uma ação emergencial, porque isso é caso de cadeia, isso
é estelionato, isso fraude e precisa ser coibido”. No final, o promotor ainda
cobrou dos prefeitos a implantação de programas sociais locais como ‘Bolsa
Estiagem’, ‘Garantia Safra’ ‘Seguro Estiagem’ e outros programas que possam
auxiliar as famílias, além dos benefícios dos governos estadual e federal.
Fonte: site Iguatu.org